CONHEÇA OS CAUSOS

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Outra versão do caso do "Peão Paulino"

O Sr. Balbino, que nos contou a estória anterior, nos emprestou o livro A freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Carrancas e sua História, escrito por Marta Amato. A autora dedicou um capítulo às lendas, “causos” e curiosidades da cidade de Carrancas, dentre os quais encontra-se O caso do Paulino que disponibilizamos a seguir.
Existem algumas diferenças entre a versão narrada pelo Sr. Balbino e a versão do livro. Porém, não se pode afirmar que esta ou aquela seja a verdadeira, pois os causos guardados na memória e transmitidos oralmente vão sofrendo modificações a cada vez que são contados. Desta forma, quem conta um conto, inevitavelmente, acaba aumentando um ponto.
LENDAS, “CAUSOS” E CURIOSIDADES
Verdade ou crendice popular? Alguns dizem que é verdade, outros não acreditam. Mas quem pode contestar o que o povo conta? As assombrações deixaram de aparecer nos nossos dias? Ou será que a televisão encobre os ruídos estranhos da noite, ou estamos sempre com tanta pressa que não nos sobra tempo para nos preocuparmos com o sobrenatural? Será que nossos avós eram mais supersticiosos do que nós? São perguntas que ficam sem resposta. Para quem acredita, o que vem a seguir tem um “quê” de real. Agora, quem não acredita é bom não passar sozinho pela porteira do Espraiado, ou se aventurar pelas estradas de Carrancas em noites de céu estrelado.
O caso do Paulino
O caso do Paulino é o mais conhecido e comentado na cidade até hoje. É um fato verídico. Aconteceu na semana das comemorações das festividades da padroeira da cidade, que é no dia 8 de dezembro.
Nessas ocasiões, as festas se prolongavam por vários dias, com quermesses, bailes, leilões, enfim, uma grande festança.
Pois bem, o caso é o seguinte:
Paulino Franco era um rapaz bem apanhado que provavelmente veio para a região com alguma tropa que passou pelo Rio da Prata, na Argentina, de onde era natural. Era um bom domador de burro bravo, não tinha nenhum melhor que ele nas Minas Gerais.
Veio para Carrancas contratado para amansar os animais da Fazenda da Rocinha e, quando terminou, foi trabalhar para o Coronel Antônio Francisco de Souza Andrade, na Fazenda da Serra das Bicas.
Logo conquistou a amizade dos moradores da pequena cidade, pois era galante, educado e muito trabalhador.
Assim integrado na comunidade, resolveu fixar raízes e conheceu Maria Jorgina Ribeiro, jovem de 18 anos, moça de boa família, filha de fazendeiros, de bons costumes, decente, honesta, que vivia de suas costuras. Era tudo o que ele precisava para compartilhar seus dias. Pediu-a em casamento. Foi recusado, não sabemos se por ela ou por seus parentes.
Pois bem, no dia 10 de dezembro de 1892, um sábado, a casa-grande do Coronel Antônio Francisco estava toda engalanada preparando-se para o baile que ia acontecer logo mais a noite.
A praça da Matriz, fronteiriça a casa, fervilhava de gente. Uma concorrida quermesse acontecia na praça e o leiloeiro chamava e desafiava os conhecidos para que arrematassem alguma prenda. Paulino, calado, não participava da alegria da festa. Num dado momento, apregoa-se uma estranha prenda: uma pequena tábua, envernizada, muito bem feitinha, com um cartaz dizendo: A TÁBUA DO PAULINO. Quando esta foi arrematada e entregue ao moço ele, intrigado, perguntou ao jovem Rozendo, filho do Coronel Antônio Francisco, o que aquilo queria dizer. Foi informado que segundo o povo, quando alguém era recusado, tinha levado a tábua.
Tinha virado chacota na cidade. Era demais para ele.Enraivecido, envergonhado, resolveu que a moça tinha que morrer, pois só assim ia lavar sua honra de homem. Decidido, arreou um burro onde colocou seus poucos pertences e deixou-o nas redondezas do povoado, preparando-se para a fuga. À noite, quando começou o baile, que era muito concorrido, entrou a casa-grande e, no intervalo de uma contradança, sem que ninguém esperasse, apunhalou a pobre moça.
A infeliz caiu morta e o assassino empunhando a arma do crime e encurralado num canto da sala, ameaçava os presentes, dizendo que quem se aproximasse teria o mesmo fim que ela.
Não percebeu a aproximação do Sr. Antônio José Corrêa, 1º Juiz de Paz e pai de Francisco Corrêa, 1º prefeito de Carrancas.
O Sr. Corrêa, sentindo-se indisposto, estava descansando num dos quartos que saía para a sala. Quando viu o ocorrido, estando o Paulino de costas para ele, usou a tranca da porta do quarto e acertando-o nas costas conseguiu derrubá-lo. O filho do Coronel Antônio Francisco, Américo Brasileiro, e outras pessoas presentes dominaram o assassino e acorrentando-o prenderam-no no pé de uma das pesadas mesas que havia na casa. Ali ele passou a noite.
No dia seguinte, a história do crime tinha se espalhado nas cidades vizinhas e, revoltados, os jovens das mesmas vieram para Carrancas, e, tirando Paulino das mãos do Coronel, amarraram-no no cruzeiro que havia na praça da Matriz.
A população não se atreveu a intervir, pois a turba irada estava incontrolável, e os moradores ainda estavam chocados com o acontecido. Ali começou o martírio do moço, que naquelas alturas já devia estar arrependido do que fizera.
Ele foi arrastado pela cidade, espancado, baleado várias vezes, mas era muito forte, sempre viveu no campo, na lida, e segurar um burro bravo era serviço para gente grande, com muita força.
Depois de muito judiado, ainda tinha vida. Então acharam que ele tinha parte com coisa ruim. Seguindo os conselhos de uma velha benzedeira, que só com uma bala feita com cera benta ele morreria, foram até a igreja, pegaram uma vela benta, com a qual esculpiram uma bala, colocaram na espingarda e atiraram. Paulino morreu.
Depois de morto, os ânimos ainda não estavam apaziguados. O medo do sobrenatural, a força e resistência do pobre coitado, junto com a superstição daquela época, fizeram com que resolvessem queimar o corpo.
Estavam juntando lenha para isso quando o Coronel Antônio Francisco interveio, pagou a um camarada para cavar uma cova do lado de fora do cemitério e para lá levar e enterrar o Paulino. Assim foi feito. Ainda se pode ver o local do sepultamento.
Alguns dos responsáveis pelo linchamento foram processados e absolvidos pelo júri do Turvo (Andrelândia).
A casa-grande, restaurada e ampliada, ainda existe. O caso ficou marcado para sempre na população e hoje algumas pessoas acreditam que, quando se perde algum objeto, é só rezar pela alma dele que se encontra.
Referência Bibliográfica:
AMATO, Marta. A freguesia de Nossa Senhora da Conceição das Carrancas e sua História. São Paulo: Ed. Loyola, 1996.

Um comentário:

  1. Não é apenas o Aecinho que precisa de um triste fim, não! Gente que faz apologia de um criminoso também merece um triste destino.

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